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28 mar 2024

Lições de Serra para emocionar a platéia

por Reinaldo Polito

Serra foi sofrível durante a campanha. Mas brilhou ao se despedir do Senado

Falando pela primeira vez depois que foi derrotado nas eleições presidenciais José Serra fez seu discurso de despedida do senado e surpreendeu pela qualidade da sua comunicação.

Acompanhei os discursos de Serra como candidato à presidência durante toda campanha e fui sempre um crítico do seu desempenho. Com exceção do último debate pela Rede Globo, em que conseguiu em muitos momentos ser superior ao seu concorrente, em todos os outros pronunciamentos Serra foi sofrível, esteve muito abaixo do que poderia produzir, e apenas uma sombra do que se espera de um candidato que deseja conquistar a Presidência.

Será que Serra ficou inteligente de um momento para outro? Será que aprendeu a falar de forma competente como num passe de mágica apenas porque deixou de ser candidato? Lógico que não.
Serra talvez seja uma das pessoas mais bem preparadas e experientes do País. Seu trabalho à frente dos ministérios que ocupou e como membro do Congresso merecem elogios até dos seus mais fervorosos oposicionistas. Mas, se a sua história política pode ser contada com todas essas letras douradas por que não conseguiu decolar desde o princípio até o final da campanha? Simples. Durante toda a campanha Serra não falou como poderia ter falado, ou seja, não falou como no dia da sua despedida.

Um Serra que não conhecíamos

No dia 18 de dezembro, ao ocupar a tribuna do Senado, Serra falou como um político destemido, envolvido, apaixonado e entusiasmado pelas suas idéias, convicto das suas posições, lúcido nas suas apreciações e guerreiro na defesa das suas causas. Abandonou o comportamento artificial, medroso e vacilante que o impediram de conquistar um número maior de eleitores e transformou-se num orador eloqüente, vibrante, determinado e muito, muito competente. Sua voz sempre firme, sonora e equilibrada manteve desde o princípio até à última frase do seu discurso o interesse e a admiração dos senadores presentes à sua despedida. Não havia ódio, rancor ou despeito no seu tom. Era sim a fala de um vencedor que tinha a consciência da missão bem cumprida e do seu papel na consolidação do processo democrático pelo qual lutou a vida toda. A postura elegante, natural, sem arrogância e sem nenhum vestígio de prepotência dominou o cenário e se projetou sem esforço sobre a platéia. Os gestos não estudados acompanhavam com perfeição o ritmo e a cadência da fala, construindo um conjunto harmonioso com o sentimento da mensagem. Interpretou um texto lido como se cada palavra estivesse brotando naquele momento do seu coração.

Atacou seus adversários sem rancor. E para demonstrar que estava determinado ao único objetivo de defender uma posição coerente em nenhum momento citou nomes e continuou a respeitar seus oposicionistas.

Foi eloqüente, sedutor, coerente, próprio, adequado, na medida justa. Não tenho nenhuma dúvida de que se Serra tivesse mostrado esse mesmo comportamento admirável durante a campanha talvez o resultado das eleições fosse outro. Acho que Serra amadureceu com a derrota. Deve ter concluído muito rapidamente que se desejar obter vitórias deverá se envolver com o coração nas causas que abraçar. Ao dizer, para os senadores que o acompanhavam maravilhados, que seu comportamento distante e aparentemente alheio não corresponde à verdade das suas atitudes pareceu querer informar que tinha assimilado a lição e que a partir daquele momento seria uma pessoa mais envolvida com seus semelhantes. Se tivesse mesmo se comportado de maneira distante estava arrependido – o tom de suas palavras diziam que seria outro, mais próximo, mais envolvido, mais presente.

No final do seu discurso foi aparteado por políticos aliados e adversários, que desejavam homenageá-lo e mostrar respeito e admiração pelo homem público exemplar que acabara de se apresentar.

Serra fez um discurso que emocionou. Aí entra um complicador de análise, pois embora a emoção possa ser percebida, possa ser sentida, dificilmente poderá ser descrita ou definida.

No meu livro “A influência da emoção do orador” para explicar a dificuldade de definir a emoção cito as palavras de W. Reich: “Apesar da linguagem refletir o estado plasmático de maneira imediata, ela não é capaz de alcançar esse estado em si. A razão disso é que o início do funcionamento da vida é muito mais profundo do que a linguagem e está além dela. Ademais, o organismo vivo tem seus próprios modos de expressar o movimento, os quais muitas vezes simplesmente não podem ser colocados em palavras”.

Significa que no seu discurso de despedida pode ser percebida uma emoção que não transpareceu durante a campanha.

Aprenda com Serra

Todos podemos aprender com o exemplo de Serra. Na vida corporativa, a todo o momento, precisamos tomar posição, defender causas e enfrentar desafios. A cada dia são novos obstáculos e maiores dificuldades – não é um comportamento passivo ou pouco motivado que nos trará as vitórias que precisamos. Não bastará apenas o conhecimento e o domínio das tarefas que precisamos desempenhar. Esses requisitos são importantes, mas não são suficientes – não bastaram para Serra sagrar-se vencedor. Precisamos nos conscientizar de que uma batalha para ser vencida exigirá disposição, empenho, coragem e muita determinação.

A vida profissional é cada vez mais competitiva e os talentos que disputarão os mesmos espaços que desejamos surgem cada vez mais bem preparados de todos os cantos. E para atingirmos os objetivos a que nos propomos deveremos aprender a aflorar todo nosso potencial e a explorar toda nossa competência. Por esse discurso de Serra foi possível verificar que por um ou outro motivo ele não foi capaz de usar na campanha todos os recursos de que podia se valer. Por isso, perdeu.

Pergunte sempre a você mesmo antes de enfrentar suas disputas profissionais: Será que me preparei da melhor maneira e estou disposto a me entregar com paixão a esta causa? Se tiver dúvidas vá buscar novas forças onde puder encontrar e não permita que a falta de determinação impeça seu sucesso. Seja como o Serra da despedida e nunca como o Serra da campanha.

Ainda a respeito de Serra, só não concordei com sua disposição de não disputar a presidência em 2006. Se ele fizer uma campanha idêntica à de 2002, estou certo, ficará de fora. Mas, se tiver o mesmo comportamento que surpreendeu a todos no dia da sua despedida está enganado, pode concorrer que terá muita chance de ser vitorioso.

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